‘Real – O plano por trás da história’ supera economês e maniqueísmo, mas ainda tem clichês
Filme conta história da criação do Plano Real e escapa de armadilhas sem se tornar memorável. Produção estreia no Brasil nesta quinta-feira (25).
‘Real – O plano por trás história’ tinha tudo para dar errado. O tema central, a criação do Plano Real, facilmente levaria a um economês de fazer dormir o mais resistente dos insones. Colocar Gustavo Franco, futuro presidente do Banco Central, como protagonista foi um prato cheio para que acusassem a produção de ser ‘de direita’. E o trailer (assista ao vídeo acima), repleto de bordões e clichês, prometia algo mais parecido a uma paródia. Mas o filme, que estreia nos cinemas nesta quinta-feira (25), supera boa parte dos obstáculos.
Assim como no livro de Guilherme Fiuza no qual se baseia, ‘3.000 dias no bunker’, o segundo longa de Rodrigo Bittencourt (após a comédia ‘Totalmente inocentes’) acompanha a trajetória de Franco (Emílio Orciollo Netto) como espinha dorsal da criação do plano Real. A missão era revitalizar a economia brasileira no governo de Itamar Franco (1930 – 2011). Ironicamente, a escolha acaba sendo a maior força do filme, assim como sua pior fraqueza.
O foco em um personagem, que cresce de seu cargo de professor universitário a presidente do Banco Central ao longo da trama, prende a atenção do público. Afinal, é mais fácil torcer por um protagonista claro, uma pessoa de carne osso, do que para algo imaterial como um plano econômico.
A produção nunca se preocupa em explicar os pormenores do plano e ninguém sairá do cinema podendo dar aulas a respeito. Ao evitar momentos de pura explicação e exposição o filme impede a dispersão do espectador. A Unidade Real de Valor (URV), por exemplo, foi peça fundamental do plano e até é citada, mas quem vê o filme não conseguirá explicar para ninguém o que é de verdade.
Escolhas como essa impedem que ‘Real’ tenha ambições maiores e o deixam preso aos chavões conhecidos do gênero. Não foi desta fez que o cinema brasileiro fez algo que possa se comparar a ‘A grande aposta’, concorrente ao Oscar de melhor filme em 2016, que explicou com agilidade e engenhosidade a crise financeira americana de 2008.
O roteiro apresenta um Gustavo Franco multifacetado, algo que o afasta do maniqueísmo e o deixa mais próximo de um anti-herói. Orgulhoso, pedante e com caráter questionável em diversos momentos, o personagem construído por Netto e pelo texto de Mikael de Albuquerque está longe de ser um supereconomista.
No entanto, com tanto tempo de tela dedicado ao protagonista (não seria injusto rebatizar o longa de ‘Gustavo – O Franco por trás do plano’), as demais pessoas a seu redor são deixadas de lado e o filme perde a oportunidade de aprofundá-las.
Não é possível – e nem crível – que a participação do presidente Itamar Franco (Bemvindo Siqueira), do então ministro da Fazenda, FHC (Norival Rizzo), e do resto da equipe ‘que recebeu carta branca’ (como tanto se diz) para a criação do novo plano tenham tido papéis tão pequenos na realidade.
‘Real – O plano por trás da história’ poderia ter sido um desastre, mas acaba se salvando ao tomar decisões corretas, ainda que sejam as mais fáceis. Infelizmente, as mesmas escolhas que resultaram em um filme honesto, poderiam tê-lo deixado memorável.
Mas e o trailer?
Ah, sim. Os incontáveis bordões do trailer (‘Eu preciso de um plano!’, ‘Você acha que eu sou um filho da puta?’, ‘Ele chamou só a nata da economia brasileira’, ‘Sua tela de trabalho é o Brasil’, ‘São milhares de investidores na parada’, ‘O Real é a moeda do povo!’, para listar alguns) estão todos lá, espalhados ao longo dos 95 minutos do longa. Alguns até perdem um pouco da força quando colocados em contexto, mas ainda garantem o sorriso para quem é fã da prévia – uma espécie de pausa bem-vinda em meio a tanta seriedade.
Fonte: site G1 (24/05/2017)